Trio: Shakuhachi, Biwa e Piano
Em atividade há mais de um ano, o trio possui um repertório de autoria própria, criado a partir de lendas japonesas antigas, narradas ao som do shakuhachi, biwa (alaúde japonês) e piano. Além disso, em nossos concertos tocamos música contemporânea, improvisos baseados em repertório tradicional e também música brasileira e argentina.
Curiosidades sobre o shakuhachi e a biwa
Você sabia que o shakuhachi e a biwa originalmente não tocavam juntos? Embora a história desses dois instrumentos tenha muito em comum, não há repertório tradicional no qual eles sejam parceiros.
Ambos foram introduzidos no Japão juntamente com a música gagaku, a partir da China. No transcorrer da história, a biwa passou a ser tocada por monges budistas cegos, chamados de Biwa-hōshi, enquanto que o shakuhachi tornou-se uma ferramenta religiosa dos monges budistas Komosō, e, posteriormente, dos monges Komusō.
A música da biwa é classificada como katari-mono, ou seja, "narrativa musical", em que o tocador utiliza o instrumento como um acompanhamento para recitar sutras budistas ou obras literárias. Por outro lado, a música dos monges tocadores de shakuhachi era puramente instrumental.
O shakuhachi e a biwa passaram a tocar juntos somente no Século XX, principalmente por influência do "boom" da Gendai-hōgaku (música contemporânea japonesa tocada por instrumentos tradicionais) ocorrido a partir de 1964. Duas obras emblemáticas desse período são "Eclipse" (1966) e "November Steps" (1967), de Toru Takemitsu (1930-1996). A primeira é um duo de shakuhachi e biwa. A segunda obra foi escrita para shakuhachi, biwa e orquestra. Ambas foram estreadas por Katsuya Yokoyama (1934-2010) e Kinshi Tsuruta (1911-1995).
Os músicos e o surgimento do trio
Os três integrantes do grupo são formados pela Univesidade de Música de Tokyo. A tocadora de biwa Yasuko Ishibiki, e a pianista Moeri Kobayashi são nascidas na Província de Ibaraki, localizada a pouco mais de 100 km da capital Tokyo. Ambas estudaram piano clássico. Além disso, a Moeri se especializou em tango argentino e a Yasuko em biwa, no estilo da Kinshi Tsuruta.
Em 2021, minha amiga Kumi Masuda me apresentou à Yasuko e à Moeri, e a partir de então passamos a tocar juntos. Até o momento, grande parte das nossas apresentações ocorrem em Tokyo e em Ibaraki. A Kumi promove muitos dos nossos concertos, e também outras atividades musicais, com seu projeto World Music Adventure, muito interessante!
Entre os locais onde já nos apresentamos está o Centro Histórico Izutsuya de Kasama, o Templo Budista Kanzou-in, Kirakudow, Furusato Museum, entre outros.
No repertório de músicas autorais, utilizamos o conteúdo de lendas, relacionadas à região ou à época em que tocamos. São narrativas musicais criadas pela Moeri e entoadas pela Yasuko, ao som dos três instrumentos. Além disso, também fazemos parcerias com outros músicos. Por exemplo, para os japoneses, o verão é uma época relacionada com histórias de fantasmas, pois o feriado de finados ocorre nessa estação. Então, nesse verão, em parceria com Yuho Kotabe, contador de histórias rakugo, realizamos um evento com lendas de fantasmas e histórias de terror na cidade de Kasama.
Outro exemplo de repertório que exploramos é o improviso. Muitas vezes, utilizamos o conteúdo melódico de peças tradicionais do shakuhachi, originalmente solo, chamadas de koten honkyoku, e acrescentamos a elas improviso de piano e biwa. Ou então, acrescentamos piano e shakuhachi em peças tradicionais da biwa.
Entre as peças contemporâneas que temos tocado, se destacam as obras de Takemitsu. Uma apresentação muito marcante, foi realizada em 2021, em Kasama. Na ocasião, Yasuk
toquei com a Yasuko a peça "Eclipse". Além de ser um ícone da música Gendai-hōgaku, curiosamente a peça foi estreada pelo professor do meu professor de shakuhachi, que tocou juntamente com a professora do professor de biwa da Yasuko. Ou seja, dois "alunos-netos" estavam reapresentando a peça estreada por seus "avós-professores". Em alguma oportunidade espero poder levar o nosso trio para o Brasil.